Verão na cidade

Sabemos que o Verão voltou quando o trânsito se faz esparso e há lugares para estacionar em todo o lado. Nas conversas de elevador, logo antes ou depois do habitual resmungo sobre o estado do tempo (ou porque já o Verão não é o que era, ou porque faz um calor fora do comum….) entra a inevitável questão: ”então, já foi de férias? ou vai ainda…?”, e saímos apressados sem querer realmente saber a resposta. Ano após ano, repete-se inexorável o ciclo das estações, indiferente às crises financeiras ou “dos mercados”, indiferente mesmo às alterações climatéricas e aos prognósticos apocalípticos mais ou menos científicos que fazem manchete. Indiferente ainda, sobretudo, ao estado de alma de cada um: goste-se ou não, “é Verão”, voltaram as t-shirts, os chinelos e os calções, as filas para a ponte sobre o Tejo e as melgas zumbindo nas noites abafadas. Pesa-nos o cansaço do “ano de trabalho”, que descreve tudo o que passou desde as últimas férias, tão depressa que custa acreditar, e contudo sempre mais penoso e demorado quanto mais perto do seu termo. Contam-se os dias numa antecipação expectante, com a apreensão dos detalhes práticos (“ e se as malas não chegarem?”, “e se a casa alugada não prestar?”). Mesmo se regressamos ao lugar de sempre, povoado das memórias de um eu que já não somos, mais jovem e inseguro, confiante nas promessas de um futuro que entretanto se fez passado. Surpreendendo-nos de cada vez com o que “tudo mudou”. Recusando admitir que mudámos sobretudo nós e que é por isso que já não podemos voltar “lá”, como na Viagem exemplar da Sophia ou na corrente das águas de Heraclito.

Senhor, que eu saiba reencontrar-Te neste Verão, dizendo com Santa Teresa d´Ávila:

“Nada te perturbe,

Nada te espante,

Tudo passa,

Deus não muda…”

Senhor, que a Tua graça me baste.

Concha Balcão Reis (“ABBA”)