IRS

Pisa-papéis, clips, marcador, calculadora em riste – e montanhas de recibos
a somar (suspiro!…), ordenados, sistematicamente, por datas, por categoria
(“IVA a 6%”, “isentas”, e outras quejandas…). No “sistema” nada está pré-
preenchido este ano – azar dos ares! – “já parecia bom demais!” – e de
qualquer modo destas somas não te livras – ao menos enquanto as possas
deduzir no tributo a César, salve!, vamos lá então, que ao menos o portal
está a funcionar, parece, e segues, absorto nesta inglória tarefa cívica,
obrigação legal, dever anual sempre deixado até ao termo mesmo do prazo …
Nisto, primeiro de mansinho, suave, refrescando da canícula que ainda agora
fazia, e já arrepio, corrente de ar, esvoaçar de papéis, sobressalto na ordem
catalogada, entra uma aragem, marota, atrevida, buliçosa, que desarruma
a tarde tranquila, desorganiza facturas, e lá fora faz ondular ramagens, num
desassossego inquieto. Pisa-papéis, clips, marcador – reposto o sossego e
ordenados os afazeres burocráticos, que a brisa inoportuna interrompera,
calculadora em riste, recomeças as somas: “IVA a 6%”, “isentas”, e outras
quejandas... Dou-vos graças, Senhor, por este aragem que se me faz
companhia, e na aridez do dever tributário Te faz presente e me consola
neste tempo entre Pentecostes e Santíssima Trindade!

Lisboa, 31 de Maio de 2012

Concha Balcão Reis da CVX "ABBA"