Estendeu-nos a mão…. abraçou-nos!

delta do Nilo

Moisés
Dá-me a mão
Há que cruzar o rio para chegar ao outro lado,
e sinto que as forças me faltam.
Acolhe-me como se tivesse sido abandonado,
num cesto de verga que se move ao sabor da corrente
e em que choro às luzes do crepúsculo.
Atravessa o rio comigo.
Ainda que as suas águas não se abram diante de nós desta vez
Ainda que Deus nos pareça não nos assistir
e uma nuvem de flechas nos agrida pelas costas.
Ainda que não haja Rio,
Dá-me a tua mão.
Vem comigo.

(parti de um poema de Luis Alberto Cuenca, que me tocou na versão original mas na tradução acrescentei-lhe uns pontos, porque foi assim que quis contar o meu conto...)
 

Ainda a propósito da missa de terça-feira passada, lembrei-me hoje da primeira leitura, Ex 14, e de como novamente fui abençoada por ouvir as palavras do Pe. Alberto sobre a recepção da notícia a 1 de Abril, junto às linhas que se cruzavam... de como deixou passar uns quantos comboios, só para poder rezar...
E nestas encruzilhadas, ocorre-me sempre um paradoxo, que ouvi algures... sempre nos queixamos de a vida ser demasiado curta, e paradoxalmente há dias e/ou noites que nos parecem demasiado longas, há cruzamentos, encruzilhadas que nos parecem demasiado entrincados...
Lembram-me quando vou buscar as muitas tralhas de Natal, e em que me aparecem sempre as “malditas” luzinhas que os meus filhos adoram, todas embaraçadas.... e o trabalho que tenho a desembaraçar, que muitas vezes nem sei por onde começar, e tem mesmo que ser por algum lado... mas as luzinhas são sensíveis... e se uma se parte muitas vezes toda a fiada já não acende... demoro minutos que parecem horas.... desembaraço, dou voltas... passa por baixo... passa por cima... às vezes ponho de parte... sento-me e rezo... e deixo uns comboios passar... depois, arregaço mangas e volto a abraçar a minha pequeníssima missão, de desembaraçar aquele “ninho de ratos”... e assim que acabo, e as ponho no presépio a iluminar o caminho das ovelhinhas, dos pastores, dos magos, e de os que mais se quiserem juntar (porque as crianças resolvem sempre que há mais uns quantos seres que também querem correr para ver o menino Jesus) até à gruta onde coloco a última luzinha, e depois ligo a ficha e oiço aquele “oh” de deslumbre e espanto das minhas crianças, sinto que valeu a pena, todo o trabalho de desembaraço, de opções que tive que tomar, para cuidar do sorriso dos meus filhos e lhes aquecer os dias e as noites com o meu abraço.

Assim vi o sorriso e a calma do Pe Alberto, qual Moisés frente ao povo hebreu, que nos dá a sua mão, mas mais, que nos abraça, tranquilo e sereno, a nós província portuguesa da Companhia de Jesus, que somos todos... os Jesuítas e os leigos, homens e mulheres, e nós CVX em particular... que também somos chamados a desembaraçar as nossas luzinhas, escolher, deixar passar alguns comboios, mas arregaçar mangas e começar a pensar em atravessar rios, pedir mãos, se for preciso, pedir pontes, se necessário, construir pontes, onde não hajam... e seguir... ainda que não haja rio!

E, indicando com a mão os discípulos, acrescentou:
«Aí estão minha mãe e meus irmãos;
pois, todo aquele que fizer
a vontade de meu Pai que está no Céu,
esse é que é meu irmão, minha irmã e minha mãe.»
Mt 12, 49-50